OpiniãoO carreirismo político nas juventudes partidárias: um risco para a renovação democrática

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Nos últimos anos tem-se assistido a uma crescente desconfiança em relação às juventudes partidárias em Portugal. Aquilo que em tempos foi visto como espaço de debate, de experimentação política e de formação cívica, tornou-se, para muitos jovens, sinónimo de carreirismo e de promoção pessoal. Multiplicam-se os artigos de opinião, tanto em jornais como nas redes sociais, que apontam estas estruturas como autênticas academias de futuros políticos profissionais, mais preocupados em subir degraus na hierarquia do partido do que em representar os anseios da sua geração.

Esta crítica não nasce do acaso. Jovens que se aproximam de um partido político com ideias e entusiasmo acabam frequentemente por perceber que o valor das propostas é secundário quando comparado com a capacidade de obediência e de lealdade às chefias. A cultura interna, marcada por hierarquias rígidas e práticas de favorecimento pessoal, incentiva mais quem se adapta rapidamente às regras do jogo do que quem procura inovar ou questionar. Não é por acaso que muitos relatam que, ao fim de pouco tempo, deixam de acreditar que a sua voz tem impacto real e sentem que o espaço das juventudes serve sobretudo para legitimar carreiras já desenhadas de antemão.

A consequência é uma evidente falta de visão estratégica. As grandes questões que preocupam os jovens portugueses como o acesso à habitação, a precariedade no mercado de trabalho, os salários baixos, a saúde mental, a mobilidade sustentável ou as desigualdades no acesso à educação, ficam frequentemente fora da agenda das juventudes partidárias, ou são tratadas de forma superficial. Em vez de propostas sólidas e projetos de interesse direto para a juventude, vemos sobretudo eventos simbólicos, conferências de ocasião e comunicados que pouco ou nada influenciam as políticas públicas. O risco é claro: afastar cada vez mais jovens da política formal, alimentando a ideia de que a participação partidária é inútil ou, pior ainda, uma forma de autopromoção.

Este afastamento reflete-se na perceção social. Para muitos cidadãos, sobretudo os mais jovens, as juventudes partidárias são vistas como trampolins para carreiras políticas e não como motores de transformação. Essa perceção, ainda que por vezes injusta para alguns militantes que genuinamente querem contribuir, é alimentada pela falta de resultados concretos e pela imagem de estruturas fechadas sobre si próprias. Em vez de renovar, estas juventudes acabam por reproduzir os vícios dos partidos que representam, minando a credibilidade do sistema democrático e dificultando a construção de uma verdadeira ligação entre os jovens e a política.

Importa, no entanto, sublinhar que este cenário não é inevitável. Existem exemplos de juventudes que, em determinados momentos, conseguiram marcar a agenda com propostas relevantes e gerar impacto político. O problema é que estes momentos são cada vez mais raros, porque a cultura dominante continua a valorizar mais a lealdade partidária do que a criatividade e a ousadia. Para inverter esta tendência, seria necessário transformar a forma como estas estruturas funcionam: tornar os processos de eleição mais transparentes, abrir espaço à diversidade de pensamento, valorizar o mérito e dar verdadeira autonomia às juventudes para influenciar as decisões dos partidos.

A política precisa de jovens, mas precisa sobretudo de jovens livres, criativos e comprometidos com causas maiores do que o seu próprio percurso. Reduzir a participação juvenil à lógica do carreirismo é desperdiçar talento, energia e inovação num país que tanto necessita de novas ideias e de novos protagonistas. Mais do que atrair jovens para os partidos, é essencial garantir que esses jovens acreditam que a sua presença faz diferença e que a política pode ser um instrumento de transformação social. Caso contrário, continuaremos a ver juventudes partidárias esvaziadas de relevância, afastadas da realidade concreta da sua geração e reféns de um modelo que não serve a democracia.

O debate sobre o futuro das juventudes partidárias é, portanto, um debate sobre o próprio futuro da política portuguesa. Se queremos que os jovens se sintam parte da vida democrática, é preciso que as estruturas que os deveriam representar sejam capazes de olhar para lá do imediatismo das carreiras pessoais e de assumir uma missão mais ampla: servir, propor e transformar. O risco de não o fazer é claro: uma democracia cada vez mais descrente, mais polarizada e mais distante daqueles que deveriam ser os seus principais protagonistas, os cidadãos do futuro.

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