OpiniãoPaços de Ferreira precisa de dados, não de slogans

Paços de Ferreira precisa de dados, não de slogans

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Paços de Ferreira orgulha-se, e com razão, de ser a “capital do mobiliário”. É um concelho empreendedor, com um tecido industrial que resistiu a crises, reinventou-se e projetou o nome de Portugal. Mas quando se tenta olhar para lá do slogan, percebe-se algo desconcertante: falta-nos saber, com rigor, quem somos hoje, como vivemos e para onde vamos.

A verdade é dura — Paços de Ferreira é um concelho praticamente invisível nas estatísticas.
Não há dados públicos fiáveis sobre o valor acrescentado da sua indústria, nem sobre quantos trabalhadores exportam, inovam ou digitalizam o seu negócio. Os números do emprego estão dispersos, as estatísticas populacionais estão desatualizadas, e não existe um retrato claro do território a nível de freguesia. Como planear políticas públicas sem saber quantas pessoas envelhecem sozinhas em Figueiró, ou quantos jovens emigraram de Frazão?

É um paradoxo gritante: um concelho que se gaba de ser moderno ainda opera com instrumentos analógicos.
Não há um portal de dados aberto, não há dashboards de transparência municipal, e nem sequer existe um levantamento atualizado da mobilidade quotidiana — quantos entram, quantos saem, quanto tempo demoram. Como comparar-nos com Paredes, Felgueiras ou Lousada se não falamos a mesma língua estatística?

As grandes decisões — sobre transportes, habitação, investimento, saúde — continuam a basear-se em perceções, não em evidências.
Enquanto outros municípios constroem portais de open data, cruzam informação geográfica com demografia, e atraem investimento com números claros, Paços de Ferreira ainda vive de relatórios avulsos e de “sensações” políticas.
E isso custa caro. Sem dados sólidos, as boas intenções tornam-se improviso; as políticas públicas tornam-se reativas; e o planeamento estratégico é apenas um exercício retórico.

O mais preocupante é que a ausência de dados serve, muitas vezes, a conveniência do poder.
Porque onde não há métricas, não há responsabilidade.
Sem indicadores de produtividade, não se questiona a falta de diversificação económica.
Sem números sobre pobreza ou habitação, não se discute a desigualdade.
Sem mapas de mobilidade, não se medem as distâncias sociais.
A invisibilidade estatística é, em muitos casos, o manto perfeito para a complacência.

Paços de Ferreira precisa, urgentemente, de um choque de transparência e de conhecimento.
Um portal de dados municipal — simples, público, atualizado — seria um primeiro passo.
Um inquérito anual às empresas do mobiliário mostraria a real força (e fragilidade) do setor.
E um mapa vivo da mobilidade revelaria as dinâmicas de quem aqui vive, trabalha e sonha.

Não basta repetir que somos o concelho do mobiliário. É preciso saber quanto valemos, quanto crescemos, quanto inovamos — e, sobretudo, quem fica para trás.
Os dados não são uma moda. São o espelho da verdade. E um concelho que não se conhece a si próprio, dificilmente saberá o que quer ser no futuro.

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