A candidata revê-se nas decisões que promovem o cidadão do concelho, mantendo os mais jovens em Santo Tirso, criando condições para que estes não sintam necessidade de se mudarem. Diz que, enquanto os demais partidos se preocupam em “manter os cargos”, o Bloco de Esquerda quer avançar com as mudanças que irão ao encontro dos habitantes de Santo Tirso.
EMISSOR: Enquanto candidata à Câmara Municipal de Santo Tirso pelo Bloco de Esquerda, e enquanto mulher e jovem, qual o seu posicionamento face aos demais políticos existentes?
Ana Silva: Eu acho que a política existente e que o sistema claramente não está a servir aquelas pessoas que eu quero representar, que são os jovens, são as mulheres, são os trabalhadores. Nós temos tido pessoas nas câmaras municipais e na Câmara Municipal de Santo Tirso, em que a única preocupação é vencer as eleições e manter o seu poder, mas a verdade é que não é isso que vai responder ao que são os reais problemas das pessoas, que é sair desta crise económica, responder às alterações climáticas e garantir um emprego digno. E é isso que eu quero representar neste momento e acho que, em Santo Tirso, nunca tivemos essa representação.
EMISSOR: Quais são as principais mudanças que quer trazer para Santo Tirso?
Ana Silva: Nós temos algumas prioridades. Há muita coisa que queremos realmente mudar, mas temos algumas prioridades. Uma delas é realmente responder a esta crise económica que foi causada pela pandemia da Covid-19. Nós já estamos a sofrer alguma dessa crise, mas vamos sofrer muito mais, com muitos despedimentos, com o fecho do comércio local e com as pessoas a perder parte dos seus rendimentos e, portanto, a Câmara Municipal tem que ter um papel muito importante nisto.
Por um lado, tem que responder às pessoas que perderam os seus rendimentos e que, portanto, tem que haver uma transparência, uma equidade, nestes apoios sociais que a câmara dá. Tem também que responder ao comércio local.
Nós vamos ver imensas lojas históricas na nossa cidade a fecharem e, portanto, tem que ser garantida uma linha de financiamento, a fundo perdido, da Câmara Municipal para estas lojas, porque perdermos o comércio local, por um lado, perdermos o emprego que ele cria e é também perdermos a nossa cidade. Vamos perder o nosso centro, vamos perder a nossa identidade. Responder a esta crise económica é muito importante.
A Câmara Municipal de Santo Tirso fez uma coisa que nós já tínhamos vindo a defender há muito tempo, que é a remunicipalização do serviço da água, ainda vai demorar algum tempo, só daqui a 2 anos é que estará concluída, mas é algo que nós sempre defendemos porque quando os serviços são municipalizados, quando os serviços essenciais como a água, como o lixo, são públicos, nós conseguimos responder às crises económicas que vamos tendo. Nesta crise da Covid-19, baixar a taxa da água, baixar o preço da água, era a primeira coisa que as câmaras deveriam ter feito. E não o pode fazer porque é privado. E, portanto, vemos com bons olhos esta remunicipalização da água em Santo Tirso.
A mesma coisa para o lixo, diminuir a taxa de recolha do lixo, diminuir todos estes preços, só é possível quando a câmara tem estes serviços. Responder a esta crise é essencial, mas há outras coisas que em Santo Tirso são muito importantes. Uma delas é o emprego, nós temos ainda emprego pouco qualificado e muito mal pago. Claro que a Câmara de Santo Tirso, há muita coisa que não consegue fazer, mas há muita coisa que consegue fazer. Uma delas é criar um manual de boas práticas para o emprego que é dado nas empresas com quem faz contratos. Nós tivemos muito recentemente o caso das cozinheiras das escolas de Santo Tirso, por exemplo, que é uma contratualização que a Câmara Municipal faz a uma empresa, neste caso a Unicelf, e as condições que esta Câmara Municipal contratualiza são indignas. Estas cozinheiras não têm um contrato a tempo inteiro; são mandadas para casa; têm salários muito baixos… E a Câmara Municipal tem que garantir que na cidade, as empresas com quem faz estes contratos tenham boas práticas laborais.
Depois, também não podia deixar de falar no bem-estar animal. Em Santo Tirso, no ano passado, tivemos o incêndio no canil da agrela, e eu acho que isso nos acordou a todos e nós temos que realmente fazer alguma coisa. Temos que continuar a denunciar os canis ilegais; temos que reforçar o canil municipal, o que não tem, de todo, capacidade para acolher os animais e, assumindo que não temos para já essa capacidade, o que a Câmara Municipal deve fazer é apoiar as associações.
À custa do trabalho voluntário, heroico, dos seus associados conseguem recolher os animais em Santo Tirso e dar-lhes vida digna. Isso é essencial.
Mais duas prioridades que temos, uma delas é a cultura. Santo Tirso tem muito pouca cultura e neste sentido existem dois eixos essenciais: uma coisa que o Bloco de Esquerda apresentou na Assembleia da República, que é um roteiro industrial do Vale do Ave. Santo Tirso tem uma grande história têxtil, uma história de trabalhadores do têxtil e de fábricas do têxtil, muitas delas agora abandonadas, porque foram à falência, e nós temos que recuperar essa história, tanto falando com as pessoas que trabalharam aí, como recuperando essas fábricas e fazendo esse roteiro.
Por outro lado, garantir infraestruturas para que consigamos ter criação artística na cidade. Por isso, a Câmara Municipal, nos próximos quadros comunitários, tem que colocar isso como prioridade.
A outra prioridade do Bloco de Esquerda será, também, a transparência. Santo Tirso tem sido notícia pelas piores razões, em termos de transparência, em termos de casos de corrupção e, por isso, é importante que nós consigamos garantir mais transparência na Câmara Municipal. Uma destas soluções passa por haver um maior escrutínio, haver uma declaração de interesses por parte de todos os eleitos na câmara e também haver uma espécie de simplex, com os documentos que saem das reuniões de câmara, das reuniões da Assembleia Municipal, porque é muito difícil, ainda, encontrar os documentos da câmara. E, também, obviamente, e ainda não percebemos porque não o é feito, haver uma gravação e uma emissão das Assembleia Municipais, das Assembleias de Freguesia e das reuniões de câmara. Para nós, isso é essencial porque isso é que é realmente democracia, em que toda a gente tem acesso a tudo o que é decidido.
EMISSOR: Considera que o facto de ser jovem trará uma mentalidade diferente e uma visão diferente daquele a que os tirsenses estão acostumados?
Ana Silva: Sim, nós estamos acostumados primeiro, a haver pouca escolha, e eu acho que também vamos introduzir um novo discurso. Um discurso em que realmente falamos daquilo que é o grito da nossa geração. Nós somos uma geração que está já a passar pela segunda crise económica. E, portanto, quando dizem que os jovens não querem saber da política, eu acho que isso é complemente mentira. Acho que os jovens têm pedido muita coisa. Têm saído à rua para que os políticos combatam as alterações climáticas; têm pedido habitação acessível; têm pedido acesso democrático à cultura e os protagonistas da política não têm ouvido isso.
Acho que estas candidaturas jovens, que o Bloco de Esquerda nunca teve problema nenhum em fazê-las, acho que vai abrir um novo espaço para que estas pessoas também se sintam representadas.
EMISSOR: Como caracteriza a sua vida ao longo dos anos? Considera que a caminhada que fez, e que continua a fazer, lhe trouxe experiências que a tornaram capaz de enfrentar o desafio de ser presidente de Câmara Municipal de Santo Tirso?
Ana Silva: Eu acho que vir de fora, de não ter a experiência que as pessoas estão habituadas, é bom. Porque a escolha aqui é muito simples: é entre aquilo que temos vindo a ter, e as pessoas que dizem que têm a experiência, mas a verdade é que a experiência que estas pessoas têm demonstrado não nos serve… Porque quando é preciso combater as empresas que fazem, por exemplo, descargas ilegais nos rios de Santo Tirso, eles não têm a experiência que é necessária. Quando os jovens e as famílias pedem habitação acessível em Santo Tirso, eles não têm a experiência necessária. E, portanto, nós trazemos ideias, propostas e toda a vontade de as concretizar.
Acho que Santo Tirso precisa disso. A escolha é entre o que temos atualmente ou novas ideias, novas caras, novas propostas.
Considera que, nesse sentido, tem a experiência que é necessária para combater esses problemas?
Ana Silva: Tenho a experiência de uma jovem que sempre cresceu em Santo Tirso. Que sabe o que é ter que sair da cidade para ter cultura. Que sabe o que é não ter transporte para chegar a casa, porque não vive no centro de Santo Tirso. Tenho a experiência de uma jovem precária, infelizmente, e acho que é isso a experiência da maior parte dos eleitores tirsenses e é isso que eu quero representar.
EMISSOR: Quais os problemas que sente, enquanto tirsense, e revê nos demais habitantes de Santo Tirso?
Ana Silva: Eu tenho 26 anos e nunca tive saneamento em casa. Era algo que se falava depois do 25 de abril, e continua sem existir. Muita da população tirsense ainda não tem saneamento básico em casa, muitos não têm água. Isso é sentido por muitos tirsenses jovens e idosos a falta crónica de transportes em Santo Tirso, que tem várias razões, uma delas é o facto da Câmara Municipal continuar a concessionar os transportes a privados e, portanto, estamos sempre sujeitos ao mercado. E essa rede de transportes tem que ser reforçada. E depois é o emprego, a falta de cultura em Santo Tirso e o desporto.
Até agora as aulas foram online e o desporto parou, o deporto de formação, e esses jovens não vão voltar ao desporto de formação. Já muitos estudos mostraram que vamos perder uma camada jovem, enorme, neste desporto. E a Câmara Municipal tem que ser uma promotora fundamental para que estes jovens voltem a fazer desporto que é tão importante.
EMISSOR: Considera que o facto de trazer experiências internacionais, proporcionou-lhe uma visão mais alargada daquilo que pretende realizar na Câmara Municipal de Santo Tirso?
Ana Silva: Sim, acho que ter essas experiências, mostra-nos que às vezes não precisamos de inventar a roda. Já há muitos projetos lá fora em que nós podemos ir buscar algum desse conhecimento e que é possível nós experimentarmos coisas novas e arriscarmos. Acho que estamos num marasmo muito grande em Santo Tirso e precisamos de trazer mais vida e de mais projetos. E é isso mesmo que o Bloco de Esquerda quer propor: projetos piloto, projetos alternativos.
Nós seguimos, por exemplo, o exemplo de Ponte Vedra, em Espanha e há muitos projetos, por exemplo, na habitação. Isto é, deixarmos de ter esta ideia de apenas habitação social e depois o resto é tudo mercado. A câmara tem mesmo de fazer esta aposta na habitação. Há vários projetos que pode seguir, mas todos têm um investimento forte por parte da Câmara Municipal, porque vai ser a única maneira de garantir que os jovens fiquem em Santo Tirso. Atualmente, por exemplo, as casas em Santo Tirso: primeiro quase não há para arrendamento e, depois, as que há, são praticamente ao mesmo preço que existe no Porto e, os jovens, com esses valores, preferem sair. Mas também os transportes, não é? Nós vemos cidades com redes de transportes que realmente respondem aos cidadãos, que são públicas, e que nós podíamos ir buscar algum desse conhecimento.
EMISSOR: Neste momento, quais as ideologias que o Bloco de Esquerda tirsense defende?
Ana Silva: Nós somos de esquerda. De uma esquerda socialista e transformadora, que acredita mesmo numa mudança do sistema da sociedade. Por exemplo, eu sou investigadora na área das ciências da saúde e agora com a pandemia da Covid-19 vimos que a ciência se esforçou imenso para responder aos problemas. Desde os investigadores portugueses que rapidamente mudaram o seu trabalho para investigar mais sobre este novo vírus, que responderam fazendo os testes à Covid que eram tão necessários e agora, por exemplo, conseguimos em temo record o desenvolvimento de uma vacina. E, portanto, a ciência respondeu. A política é que está a demorar mais tempo a responder, e apenas por uma cegueira ideológica muito grande, é que nós não estamos neste momento a discutir a libertação das patentes, por exemplo.
Por isso é que o projeto do Bloco de Esquerda é socialista, é transformador da sociedade. Porque nós defendemos que, num momento como estamos e esse caso das vacinas é paradoxal, é impensável nós não estarmos neste momento a discutir a libertação das patentes, a transferência de tecnologia e conhecimento para outros laboratórios, para todos juntos desenvolvermos mais vacinas e algo que também parece que os países ainda não perceberam é que, ou saímos disto todos juntos, ou não saímos.
Isto dos países mais ricos estarem a receber parte das vacinas e depois os países mais pobres praticamente ainda não terem recebido dose nenhuma, vai fazer com que esta pandemia nunca acabe, porque vivemos num mundo global, e ainda bem, temos que ser todos vacinados e temos todos que estar protegidos para realmente voltarmos à nossa vida normal. E com o sistema capitalista que nós estamos a viver neste momento, em que o lucro é posto à frente de todas as pessoas, não vamos responder a essa crise, nem vamos responder à crise das alterações climáticas. Acho que só com um projeto socialista é que nós responderemos a isso.
EMISSOR: Qual a diferença que o Bloco de Esquerda faz da demais esquerda?
Ana Silva: Está a haver mais uma reconfiguração da direita do que da esquerda. Eu acho que a esquerda se tem mantido fiel a si própria e tem-se mantido estável. Eu acho que, em relação ao Partido Socialista, acho que as diferenças são evidentes. Nós defendemos um maior apoio social, principalmente neste momento e que deixemos esses dogmas de que não se pode mexer no privado, não se pode mexer nos lucros. Já falamos das vacinas, podemos falar, também, dos hospitais privados que podiam, e deviam ter respondido, a todas estas vagas de Covid e só não o fez porque o Partido Socialista não o quis. E, por isso, essa diferença entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista é evidente. E, em relação a outras forças de Esquerda, eu acho que é um modelo de sociedade em que toda a gente seja realmente livre, em que qualquer pessoa possa ter a sua orientação sexual, em que qualquer pessoa possa decidir o género que tem, em que todos os direitos são respeitados para além do trabalho, as nossas individualidades também são respeitadas.
EMISSOR: Revê-se em alguma medida tomada pelo atual autarca de Santo Tirso?
Ana Silva: Revejo-me na remunicipalização da água, acho que é essencial, acho que é um meio para respondermos a qualquer crise que tenhamos e também é um meio de garantirmos mais qualidade, para além de baixarmos o preço, é preciso aumentar a qualidade do serviço.
Esta é uma medida que o Bloco de Esquerda já tem defendido há muito tempo. Veremos como é que ela é feita. Nós vamos ter que aguardar algum tempo e vamos ter que pagar muito dinheiro, e isso é só mais uma prova que estes contratos e concessões a privados são ruinosos, e não conseguimos perceber como é que foi feita uma concessão de 50 anos. Isto foi feito mais ou menos na altura em que eu nasci, portanto só quando eu tivesse 50 anos é que a água deixaria de ser concessionada à Indaqua.
Acho que foi uma boa decisão, agora é preciso ir mais longe, por exemplo, na recolha do lixo, vamos ter que fazer a mesma coisa.
EMISSOR: O que é Santo Tirso para si?
Ana Silva: Eu acho que Santo Tirso é feito de tirsenses muito trabalhadores e eu acho que gostava muito de viver numa cidade em que o trabalho fosse valorizado, e que houvesse mais trabalho qualificado. E o que nós temos visto atualmente é que os tirsenses estão a fugir da cidade, porque vão trabalhar para outro sítio, porque depois arranjam casa noutro sítio e, depois, raramente voltam.
Eu gostava de uma cidade em que as pessoas quisessem mesmo lá ficar e que todas tivessem condições para lá ficar. Sejam jovens, sejam famílias, pessoas solteiras, os idosos, que tivessem todas as condições na cidade, de desporto, de mobilidade, de cultura e que respondesse a todas as pessoas.
Agora, com a crise que vamos passar, que seja uma cidade à espécie de almofada das crises que vamos passando, que garante que ninguém fica sem casa, que ninguém passa fome, que não há ninguém que fique sem estudar porque não tem dinheiro. E, portanto, uma câmara social. É isso que eu gostava para Santo Tirso.
EMISSOR: Gostaria de deixar uma mensagem por si e pelo Bloco de Esquerda para os tirsenses?
Ana Silva: Sim, eu acho que durante muito tempo tivemos poucas opções em Santo Tirso e, pela primeira vez, temos mais. E isso também nos traz mais responsabilidade. A responsabilidade de pensarmos, a nossa sociedade e a nossa cidade. Enquanto as outras candidaturas estão preocupadas em ganhar as eleições porque querem manter os cargos, porque querem manter o seu poder já estabelecido. Nós queremos responder àquilo que são os problemas das pessoas e, para isso, precisamos da confiança das pessoas, precisamos do apoio e precisamos de toda a gente para pensar num novo modelo para Santo Tirso.