Há pessoas que têm por princípio inabalável de que terem uma visão alternativa da realidade é estarem, invariavelmente, certos. Pessoas que acreditam que construir uma narrativa não alinhada é ver mais além. Pessoas que sendo, de facto, instruídas e capazes de leituras da realidade mais complexas, creem que tal condição legitima, per-se, a sua visão “não mainstream”.
Mas por vezes uma guerra é só mesmo uma guerra injusta com um só culpado.
Por vezes, uma guerra é tão-somente um ato hediondo de uma das partes sem defesa possível, mesmo para um partido saudosista.
Por vezes, o uso do maniqueísmo é a única forma honesta de se analisar a realidade.
Por vezes, um invasor ilegítimo e sanguinário é só mesmo isso. E muitas das vezes um “filho da mãe” é mesmo um psicopata sem qualquer empatia pelo sofrimento dos outros, crianças, velhos, jovens que estão do outro lado, pois não são os seus netos, pais, irmãos e irmãs.
E como tal, sinto-me entre o estupefacto e angustiado quando vejo nomes maiores do nosso saber a defenderem soluções para o conflito Russo-Ucraniano na base de truísmos estéreis que mais não são do que ensaios de defesa de posições ideológicas e dogmáticas disfarçadas. E mais indignado fico por essas posições serem etnocêntricas ao ponto de não conseguirem compreender porque é que os jovens e os menos jovens Ucranianos se voluntariam para a guerra, mesmo sabendo da pouca possibilidade de dela saírem vivos ou saudáveis, quando a incompreensão deveria estar do lado oposto. Ou seja, como é possível que em pleno séc. XXI jovens Russos acedam participar numa luta que não é a sua, invadindo um país irmão e soberano, matando os seus de sempre.
Bem! Talvez para esses “opinion-makers” fosse interessante perceber que quando um povo orgulhoso, identitariamente coeso, fervorosamente patriota e com um forte sentimento de pertença nacional e coletivo é atacado no que de mais central tem a existência, isto é na sua identidade coletiva, esse povo interioriza que pouco terá a perder e a morte não será a pior das consequências. Pior do que a sua morte será a mortificação de várias gerações vindouras à mão de um regime que os quer coartar no que de mais importante têm: a liberdade, um estilo de vida ocidental, europeu, progressista e um território que é parte integrante e indissociável do seu “eu”.
Por esse motivo, muitos desses homens entre opressão e a libertação escolhem a última, mesmo correndo o risco de morrerem às mãos do inimigo.
Entre o falecimento da soberania nacional e o seu próprio falecimento, ou a possibilidade deste, muitos escolhem tornarem-se reféns do destino.
O que está em causa nesta guerra é, pois, muito mais do que a disputa de um território ou a sua defesa, é, também, a defesa de um modo de vida, a defesa de um modelo de nacionalidade e de identidade nacional baseada na livre escolha de pertença a semelhantes associados, os restantes Europeus, que vai muito para além da questão de pertença étnica.
Assim, para muitos Ucranianos desistirem da sua identidade é desistirem de si mesmos e do futuro dos seus, logo a opção é lutar, sem culpa e remorsos. A alternativa de fugir à guerra, a qual será igualmente legítima, implicaria além de tudo o mais, transportar para sempre uma culpabilidade insuportável pela quebra de vínculos, de lealdades e de solidariedade com os seus compatriotas.
De facto, por vezes alinhar pela maioria é só mesmo ser sensato e humanamente empático e justo!
Marcos Taipa Ribeiro