Nos bastidores da participação cívica e pública, existe uma linha ténue entre a pertença e o afastamento. Durante anos, dei o melhor de mim em projetos onde se esperava envolvimento, dedicação e espírito construtivo. No entanto, começa a ser claro que o problema nunca foi o meu posicionamento, mas sim a forma como alguns espaços de decisão se sentem desconfortáveis com quem não segue o guião pré-escrito.
Não deixei de acreditar nos valores em que sempre acreditei. Continuo a defender a justiça social, a responsabilidade, o equilíbrio entre tradição e mudança. O que se alterou não foi a minha forma de pensar, mas sim a forma como pensar livremente se tornou, para alguns, um incómodo difícil de tolerar. Tenho assistido, com tristeza, à forma como estruturas que deviam valorizar o mérito, a diversidade de pensamento e o espírito crítico se foram tornando reféns de lealdades pessoais, silêncios convenientes e decisões pré-cozinhadas. Não se trata de discordância ideológica, trata-se da incapacidade de lidar com quem questiona, propõe ou simplesmente se recusa a ser mais um.
Afastam-me não as ideias, mas as atitudes. Afastam-me os processos sem transparência, a falta de abertura ao debate, a forma como se silenciam ou ignoram contributos válidos apenas por não virem da pessoa certa. Afastam-me os sorrisos forçados e as portas fechadas a quem não quer apenas alinhar, mas construir.
A vida pública, mesmo à escala local, não pode ser um palco para quem confunde liderança com controlo, nem pertença com submissão. O afastamento de pessoas ativas e comprometidas não é culpa de quem sai, é sim, responsabilidade de quem fecha o espaço ao diálogo e à diferença. E é precisamente aí que tudo se perde.
Leonor B. Silveira