Jéssica Teixeira e Vanessa Freire são duas atletas pacenses do Clube Aquático Pacense e estiveram, recentemente, em Malta a representar Portugal com a Seleção Nacional.
EMISSOR: Como é ser atleta de polo aquático?
Vanessa Freire (VF): Eu comecei a praticar polo aquático em 2006, porque o meu irmão já jogava, então eu decidi arriscar. Mal decidi arriscar, parecia um peixinho dentro de água, foi algo que eu adorei. Portanto, em 16 anos só estive parada um ano e meio, isso quer dizer muita coisa.
EMISSOR: O que é que vos diferencia das outras para terem conseguido chegar à seleção portuguesa?
Jéssica Teixeira (JT): Eu acho que há aspetos, tanto psicológicos como físicos, para chegarmos onde estamos, para além do trabalho que fazemos nos clubes. A nível psicológico é aquela ambição de querermos mais, de queremos chegar mais longe e um certo perfecionismo de querermos fazer as coisas bem. De treinarmos como se estivéssemos em jogo, ou seja, sempre a darmos o nosso melhor. Depois a nível de aspetos fisiológicos, todos os desportos têm os seus biótipos, aquele tipo corporal que se adequa mais, não quem não haja exceções, óbvio que há, mas juntando essas duas componentes acho que nos faz chegar, mais o trabalho que fazemos no clube, acho que nos faz chegar ao nível em que estamos.
EMISSOR: Como é que o desporto do Polo Aquático é visto lá fora?
JT: É assim, eu acredito que há países que o polo aquático está basicamente ao nível de Portugal ou a baixo, mas temos o exemplo dos países de leste, como Croácia, Sérvia, Hungria, Montenegro que vivem o polo aquático como nós vivemos cá o futebol, ou seja, é o deporto rei. Mas nem é preciso irmos muito longe, temos aqui ao lado Espanha, por exemplo, que nos últimos dez anos cresceu imenso. Tem títulos europeus, mundiais e olímpicos porque começou a haver um compromisso e investimento por parte da federação, que começou logo nos escalões de formação e isso fez com que o desporto no país crescesse bastante.
EMISSOR: Qual a diferença de se ser atleta de polo aquático de outros desportos?
JT: É muitas vezes termos de optar entre a vida pessoal ou profissional e o desporto que praticamos, tanto a nível de seleção, porque não somos profissionais, como de clube. É termos de nadar quilómetros e não sermos da natação, depois disso ainda temos de treinos técnicos e táticos, treinos de ginásio, às vezes jogos-treinos durante a semana e ainda termos jogos ao fim de semana. Acima de tudo é termos a certeza que gostamos do desporto que praticamos porque a visibilidade é tão baixa que chega a um ponto que muita gente desiste e se nós continuamos durante imensos anos significa que estamos aqui mesmo por amor ao desporto.
EMISSOR: Como foi a experiência de representar Portugal? Foi a primeira vez?
VF: Não, não foi a primeira vez. A Jéssica já representou dez vezes Portugal e eu já representei quatro vezes e digamos que é sempre um orgulho enorme, a sensação de cantar o hino antes dos jogos é espetacular, acho que é mesmo uma experiência que toda a gente devia viver, mas lá está não dá para todos, só mesmo os melhores é que estão lá, mas é incrível cada vez que estamos a representar Portugal.
EMISSOR: Que tipo de ensinamentos estas experiências vos dão?
VF: Estas experiências dão-nos, especialmente, o que é a visão do polo aquático lá fora. Nós conseguimos treinar e jogar com atletas que isto é a vida delas, é a profissão delas, elas treinam de manhã, treinam à tarde, treinam à noite, têm 100 jogos por ano, são muitas equipas no campeonato, mas também temos exemplo de campeonatos que também são pequenos como é o caso de Malta, que também são cinco equipas no campeonato. O facto de treinar e jogar com atletas melhores do mundo, nós conseguimos sempre absorver alguma coisa ou os passes ou os remates ou a técnica de nado, qualquer coisa é bom para nós conseguirmos captar isso. Nós antes de irmos para Malta, tivemos um estágio em Barcelona de quatro dias, em quatro dias fizemos seis treinos com atletas espetaculares.
JT: De elite.
VF: Incríveis, sensacionais. E nós estar a poder viver isso foi incrível, é mesmo uma experiência que tiramos para a vida e conseguimos absorver um bocado disso e trazer para os nossos clubes, que também é muito importante.
EMISSOR: Qual é a vossa opinião face à desvalorização que quase todos os deportos têm em Portugal, exceto o futebol?
VF: É desmotivante, lá está, pelas razões que a Jéssica já disse e eu também já mencionei, nós não somos profissionais, somos amadoras, todas trabalhamos, todas estudamos, temos de fazer um esforço enorme para conciliar tudo e o polo aquático não é um desporto que basta talento, é preciso muito compromisso, muito sacrifício, muita dor no corpo. É um desporto muito físico, portanto, mesmo depois disto tudo o polo aquático não ser um desporto muito conhecido em Portugal, porque não é, maior parte das pessoas perguntam se nós jogamos com o pé no chão da piscina ou o que é polo aquático e não, nós não jogamos com o pé no chão da piscina, estamos sempre em constante movimento, é um desporto muito físico mesmo, depois disto tudo ver que não é o suficiente para as pessoas conhecerem esse desporto é desmotivante, mas por acaso no início deste ano tivemos a sorte de participar na liga dos campeões, é um evento único no polo aquático que nós nunca sonhamos sequer participar e com o apoio da câmara municipal de Paços de Ferreira, do nosso clube e dos nossos patrocinadores sentimo-nos um bocadinho mais valorizadas e apoiadas, mas é um apoio que tem de ser contínuo.
JT: Sim.
EMISSOR: Pretendem fazer do Polo aquático vida? Veem-se a fazer isto para sempre?
JT: Para sempre não porque o corpo também não permitiria, mas é um sonho que vai crescendo, conforme uma pessoa vai evoluindo no desporto em si, só que Portugal ainda não apostam a esse nível, principalmente nas equipas femininas, nas masculinas já começa a surgir, mas em feminina ainda não. Para ir para fora ou assim, é difícil vindo de um país que o desenvolvimento do polo aquático ainda não é assim muito grande torna-se complicado.
EMISSOR: Acreditas que estes destaques, por parte dos media, é uma mais valia para vocês, enquanto atletas, para o desporto e para o clube aquático pacense?
JT: Sim, porque lá está, aumenta-nos a visibilidade do desporto em si. Tentamos captar os jovens a interessarem-se e isso mais tarde pode fazer com que haja vontade por parte da câmara municipal, federação e tudo mais de crescerem os números de atletas de investirem na modalidade em si.
EMISSOR: Durante a pandemia COVID-19, como foi a vossa experiência? Estiveram sempre paradas? Que tipo de medidas foram tomadas?
JF: A pandemia começou em março e nós fomos dos clubes que tivemos, a sorte, de por volta de julho já tínhamos regressado às piscinas, ou seja, em treinos presenciais, mas nesse espaço de tempo a única coisa que nós podíamos fazer era treinos que o nosso treinador nos mandava, em casa, via zoom, às vezes fazíamos reunião via zoom para não ser tão chato outras vezes que não pudesse não fazia. Nesses meses era a única coisa que conseguíamos fazer, treinos de força em casa, ginásio, desse género. Quando voltamos à piscina ainda havia restrições, aquecimento fora de água, era com máscara, não podíamos fazer jogo entre nós, não podia haver contacto entre nós, em vez de nadarmos numa pista de natação, duas pistas equivaliam a uma, para manter os distanciamentos enquanto nadávamos. No meio disto tudo, os escalões de formação, os sub-14 são os que sofreram mais porque só começaram a pegar na bola muito mais tarde, comparativamente a seniores.
EMISSOR: Que tipo de coisas gostavam de ver alteradas no vosso desporto ou existem coisas que vocês gostassem de ver mudadas no vosso desporto?
JT: A nível da seleção feminina já houve algumas alterações, surgiu um novo acreditar, tanto por parte dos técnicos envolvidos como da equipa em si, mas precisamos que toda a gente que esteja envolvida no mundo do polo aquático acredite tanto como nós. A verdade é que o trabalho tem de começar nos clubes, sim, mas os clubes sozinhos não conseguem fazer tudo. Tem de haver um aumento de compromisso desportivo perante os clubes e um investimento, uma aposta por parte da federação também porque parecendo que não, quando sentimos que apostam em nós, que estão a investir em nós há automaticamente um aumento de motivação por parte desses atletas, sente-se essa motivação por parte dos atletas, ou seja, o compromisso dos atletas perante a modalidade também vai aumentar, o que faz com que o polo aquático cresça.
VF: Acho que é mesmo isso que mudávamos, o investimento no polo aquático.
EMISSOR: No que diz respeito à comunidade, que mensagem gostariam de lhes deixar com o propósito de vos apoiar mais e ao desporto?
JT: A realidade é que a maior parte das pessoas que se encontram na bancada ou são familiares ou são pessoas relacionadas aos praticantes, que por um lado quando vão ver um jogo de polo aquático tornam-se automaticamente fãs.
VF: Fãs.
JT: Ou seja, isso não invalida que outras pessoas que não conheçam alguém ou algum praticante de polo aquático não caiam na mesma paixão pelo polo aquático, porque é um desporto com muitos golos, com muito contacto, muito ativo que faz com que uma pessoa fique presa ao jogo em si, portanto, óbvio que nós gostaríamos de ver muitas mais pessoas envolvidas com o polo aquático. A nível de clube, sentir a vibração de jogo com as bancadas cheias torna o jogo do polo aquático um espetáculo incrível e nós próprias atletas dentro de água sentimos muito essa força e o carinho que vem da bancada.
VF: É o que nos faz querer marcar mais um golo. Meio golo, como o João Pedro diz, o nosso treinador, meio golo basta para vencer e este último jogo foi a prova disso, nós ganhamos por um golo, penálti da Jéssica, mas eu acredito que a força da bancada tudo te motivou a querer marcar um golo. Na altura da pandemia, quando as bancadas estavam fechadas era um jogo triste, era mesmo triste porque as pessoas vibram connosco.
JT: Sim e temos sorte que os clubes começaram a apostar nas transmissões online que por um lado fez com que a modalidade não morresse ainda mais digamos assim.
VF: As pessoas berravam pelos comentários.
JT: Sim, basicamente.
VF: Mas é super importante haver transmissão, é super importante haver bancada, apoio, nós vibramos. Para eles é espetacular porque lá está é um jogo com muitos golos, claro que há jogos com poucos golos e é super cansativo, um jogo sem golos, porque temos 30 segundos para atacar, sempre a atacar e defender, atacar e defender e não haver aquela pausa do golo para ir a bruços para o meio da piscina é muito cansativo, então um jogo com muitos golos, a bancada vibra connosco, nós podemos descansar mais um bocadinho, mais 20 segundos e tudo isso importa, tudo isso faz do polo aquático…
JT: Um espetáculo.
VF: Um espetáculo.