A última década ficou marcada por grandes desafios políticos no concelho de Paços de Ferreira. Depois de 2013, com a saída do PSD da Câmara Municipal, o PS de Humberto Brito subiu ao poder sustentado a promessa de resolver o problema da água e do saneamento, numa altura em que o concelho era conhecido por ter ‘a água mais cara de Portugal’. As vigílias, os protestos e as frases como ‘Obrigado, Pedro Pinto’ ajudaram a virar o eleitorado e empurraram os socialistas para uma vitória histórica.
Humberto Brito prometeu rasgar o contrato com a AGS e resgatar a concessão para a esfera pública. Essa promessa foi repetida vezes sem conta e tornou-se o grande argumento eleitoral de 2013. E foi eficaz porque convenceu, venceu e liderou a Câmara durante três mandatos. No entanto, quando saiu para assumir o lugar de deputado, deixou para trás a promessa que nunca cumpriu. E pior, agravou o contrato para os pacenses, deixando o concelho numa situação ainda mais delicada do que aquela que encontrou.
Há muita matéria por explicar aos habitantes de Paços de Ferreira. Um dos exemplos mais graves é o contrato de renegociação da dívida com a AGS. Esse acordo previa que a empresa concluísse a rede de saneamento, que ainda hoje não cobre todo o concelho, e introduzia condições que protegiam os munícipes, reduzindo a taxa interna de rentabilidade (TIR) e eliminando novos pedidos de reequilíbrio financeiro. Estava tudo acertado entre a AGS e a autarquia. Faltava apenas a assinatura de Humberto Brito. O Tribunal de Contas confirmou depois que o contrato nunca foi assinado e nunca houve uma explicação convincente para isso.
A situação tornou-se ainda mais difícil de compreender quando, pouco antes de sair, o então presidente assinou um novo contrato com as Águas de Paços de Ferreira (antiga AGS), prolongando a concessão por mais 15 anos e agravando os encargos para as famílias. É difícil perceber como um contrato que protegia os pacenses ficou esquecido numa gaveta enquanto outro, claramente desfavorável, avançou sem debate público.
Também não se entende o silêncio da oposição no executivo municipal ao longo de todo este processo, nomeadamente sobre o ‘esquecimento’ de Humberto Brito sobre o contrato de renegociação acordado. Era responsabilidade da oposição fiscalizar, questionar e defender os interesses das pessoas. Ao não o fazerem, acabaram por permitir decisões que prejudicam os munícipes e fragilizam a confiança na gestão pública.
Os números mostram que este é um problema sério. A concessionária chegou a pedir 91 milhões de euros em reequilíbrio financeiro e a autarquia tinha mais de 50 milhões de euros em provisões devido ao contrato da água, conforme refere o relatório do FAM de 2022. Estes valores são pesados e têm impacto direto na vida das famílias e nas contas futuras do concelho.
O caso da água em Paços de Ferreira vai continuar a fazer correr muita tinta. Mais cedo ou mais tarde, a verdade virá ao de cima. E quando isso acontecer, haverá quem tenha de explicar porque tomou determinadas decisões e quem tenha de justificar porque preferiu ficar calado.




