“Sentimos que a terra nos sai debaixo dos pés”, relata Filipe Monteiro, um doente oncológico que lutou contra o cancro em 2006 e saiu vitorioso em 2009, tendo ultrapassado por um cancro no intestino e um cancro no pulmão direito. Na altura, refere que a reunião do corpo clínico sugeria que “não valeria a pena iniciar qualquer tratamento, dado o estágio avançado do tumor e do prognóstico muito reservado para sobrevivência”, no entanto, recorda que a médica oncologista que o seguiu e que foi capaz de realizar a primeira cirurgia “contra tudo e contra todos”, permitiu que, hoje, Filipe Monteiro contasse a sua história.
A história de Filipe Monteiro aquando este trabalhava numa indústria de produtos químicos, onde entrava às 8h e saía às 20h/21h, enquanto membro da direção da indústria. Na sua apresentação, Filipe Monteiro confessa que “eram muitas horas” e que muitas vezes acabava por não ir à casa de banho devido ao imenso trabalho que tinha, o que acabou por contribuir para o aparecimento de um cancro no intestino.
O cancro de Filipe Monteiro foi descoberto quando este tinha 41 anos, e o próprio conta-nos que o momento em que descobriu que tinha um tumor foi um momento de “incredibilidade” e, posteriormente, de “aceitação da doença” com a questão “ que tenho de fazer para combater a doença?”.
Assim, passo a passo, Filipe Monteiro foi capaz de reunir forças para procurar ajuda. Após ter detetado o problema no final de novembro de 2006 através de uma colonoscopia, foi realizada uma biópsia para recolha de uma amostra de uma massa que tinha sido localizada. Essa biópsia veio confirmar, em janeiro de 2007, o cancro de Filipe. A partir daí, Filipe Monteiro relata a procura de soluções para a cirurgia, quer no privado, quero no IPO de Coimbra, opção que foi escolhida por ser mais breve. De acordo com Filipe “a primeira cirurgia foi um enorme ‘baque’ para todos, pois a ‘barriga aberta’ permitiu ver que o tumor era já uma massa enorme oculta por detrás da bexiga, tendo já saído do intestino e invadido mesmo aquele órgão, não permitindo a remoção”.
Após essa análise, iniciaram-se os tratamentos, os quais Filipe descreve que “resultavam naquilo que chamávamos de ‘semana má’ e ‘semana boa’, já que na primeira semana, após remoção da bomba (infusora) vinham os enjoos, a maior dificuldade de comer, a incapacidade de estar em ambientes com aromas fortes…, a que se seguiam uns dias com um pouco mais de conforto, com menos enjoos, mas onde recomeçava tudo de novo”.
Filipe Monteiro passou por vários tipos de tratamentos, contabilizando 9 sessões de 50 horas de quimioterapia tendo removido, posteriormente, “o tumor, junto com algumas áreas envolventes, por segurança, e que no meu caso resultou na perda de um troço do intestino e de parte da bexiga, além de seis gânglios, um dos quais se veio a comprovar estar também infetado”. O tumor foi, inclusive, referenciado como T4N1Mx, como o T sendo a extensão do tumor, indo de 1 a 4, sendo o mais grave; o N referenciando o número de gânglios envolventes afetados e o M as metástases à distância, no caso, como não havia nenhuma, o ‘x’.
Posteriormente, realizou mais seis sessões de quimioterapia, igualmente com 50 horas cada uma, sendo que “a médica oncologista tinha optado por terminar as sessões, até porque estas seriam já mais preventivas, procurando eliminar algumas células potenciadoras que tivessem viajando pela corrente sanguínea e poder infetar novo órgão, o que se veio a confirmar com o aparecimento de uma metástase, dois anos depois, num dos pulmões”, aquando foi submetido a nova cirurgia e realizando mais sessões de quimioterapia, perfazendo um total de 1000 horas. A partir daí vai “fazendo análises, TAC’s e outros exames de controlo, agora apenas com periodicidade anual, e felizmente até ao momento não voltaram a evidenciar nenhum sinal de novo foco tumoral”, conclui.
Apesar do prognóstico realizado para Filipe Monteiro ter sido, à partida, muito reservado para a sobrevivência, hoje, Filipe Monteiro agradece à médica oncologista “que assumiu fazê-lo”.
De acordo com Filipe Monteiro a família foi “de extrema importância” sendo a peça fundamental “a esposa”. Da mesma forma, realça também a importância dos amigos e conta que “uma amiga que durante 2007 e 2009 veio diariamente visitar-me a casa, trazendo novidades da fábrica onde também trabalhava, fazendo-me sentir ainda útil com os meus conhecimentos e sugestões para resolução dos problemas que uma indústria produtiva habitualmente enfrenta no seu dia a dia”, considerando a família e os amigos peças fundamentais.
Filipe Monteiro declara que o momento mais difícil, para si, de ultrapassar, foi a notícia de ter um cancro e, seguidamente, a questão dos tratamentos, uma vez que o organismo “começa a sentir-se ‘afetado’ e a rejeitar muitas coisas, nomeadamente a alimentação pelos enjoos causados” e confessa que, ainda hoje, rejeita alguns aromas que o fazem lembrar dessa fase de tratamentos.
A par desta fase da sua vida, Filipe Monteiro refere que a “frase chave é: cada tratamento é um passo em frente no caminho que nos conduz à meta vitoriosa! É fundamental ter uma atitude positiva, confiar nas equipas que nos acompanham e, claro, cumprir as indicações médicas e não lhes ocultar nada”. Considera ainda que “a esperança deve ser a última a morrer e nós só nos devemos dar por derrotados já depois dela ter morrido”.
Descobrir o cancro durante o confinamento
Nilza Magalhães descobriu aos 42 anos que tinha cancro referindo que “por mais incrível que pareça, essa doença foi-me diagnosticada no meio de uma pandemia (covid). Assim que fui observada pela minha médica de família, mandou-me imediatamente fazer uma ecografia e mamografia”, adianta Nilza, acrescentando que, posteriormente, “no dia do exame, a médica radiologista aconselhou-me a fazer uma ressonância com seguimento de biópsia e que independentemente do resultado da biópsia teria que fazer uma cirurgia. Nesse dia o meu mundo desabou, só chorei com o meu marido… Na hora ligou-me uma amiga que sabia da realização do exame, eu não conseguia falar, só chorava, e ela chorava do outro lado…”.
Nilza Magalhães soube que tinha cancro, não tendo sido uma descoberta fácil para si no meio de um confinamento, revelando ser mãe de filhos gémeos, acredita que foi neles onde foi buscar forças. Considera que “em nenhum instante passei um ambiente pesado, triste e preocupante na nossa rotina, tudo em casa continuou com leveza. Acredito que até hoje os meus filhos não se deram conta do que se passou e o que se passa com a mamã”.
O testemunho de Nilza segue muito a linha da fé e da esperança, declarando que “tudo se alinha para o melhor, mas é muito mais difícil quando as coisas parecem andar para trás, e foi nesse momento que tive de puxar toda a energia cá para fora, respirar bem fundo, e ir buscar toda a minha fé, porque na verdade somos bem mais que um conjunto de células organizadas, algumas que sofrem mutações malucas!”, explica animada.
O apoio de Nilza, enquanto crente, vai ao encontro de Deus, quando esta menciona que estar “um pouco cansada, por vezes revoltada, mas depois penso logo: se veio ter comigo é porque vou conseguir. Deus só dá estas provações a pessoas fortes e eu sinto-me uma pessoa forte!”.
“É como diz um amigo meu, ficarei com mais uma história para contar… E a riqueza da nossa vida é o número de histórias que temos para poder contar”
Por fim, no seu testemunho, Nilza Magalhães diz que “o cancro quer o meu medo, mas não vai ter nada disso. Ele vai aprender, uma vez que se meteu comigo, que não consegue paralisar-me, mas diria que é normal e natural ter medo. Nunca estamos preparados para enfrentar um desafio desses!”. Numa mensagem dirigida aqueles que padecem da mesma doença, Nilza chama à atenção para “um segredo muito importante que o meu médico me disse depois de eu estar a agradecer tudo o que tem feito por mim foi: ‘Para haver grandes médicos, é necessário termos grandes pacientes’. Tenham muita força, por isso é o mais importante para a cura…”, finaliza.
Como aprender a lidar com o cancro?
Andreia Costa tem 41 anos e foi-lhe diagnosticado cancro da mama em 2017. Andreia era enfermeira, tendo trabalhado 15 anos em contexto hospitalar, no entanto, após a doença, conta que deixou de trabalhar em enfermagem para começar a trabalhar noutras formas de otimizar a própria saúde. Assim, Andreia Costa especializou-se em “Cancer Coach” (Coach de Cancro) e, hoje, ajuda outras pessoas, psicologicamente, a atravessar a doença.
Para intervir quando um doente com cancro a contacta, a coach refere que “começa por avaliar as expectativas do doente em relação ao que lhe posso oferecer. A minha abordagem é sempre integrativa. Sendo assim, avalio inicialmente todas as áreas da vida do doente, desde a alimentação, o sono, o stress, o exercício físico, as suas relações, a sua condição profissional”, explicando que, além de ‘físico’, uma pessoa é também ‘mente’ e ‘emoções’, sendo que todas as áreas acabam por ficar afetadas pela doença, revelando ser “sobre isso que eu ajudo o doente a atuar”.
As formas de guiar o doente são variadas e Andreia Costa explica isso mesmo, uma vez que “pode passar por alteração de hábitos alimentares, por introduzir o exercício físico consistente no seu dia a dia, pela introdução de técnicas de autoconhecimento como o journaling ou a meditação. Há imensos métodos, técnicas ou ferramentas que podem ser utilizadas, mas tudo é sempre adaptado ao doente em causa. O que pode ser a cura para um pode ser o veneno para outro. O ponto principal aqui é mesmo a bio individualidade”, confere.
“No coaching o que se pretende é que o doente aumente a conexão consigo mesmo, para que ele sim, consiga responder as questões que o inquietam. Eu o que faço é facilitar esse caminho. Não sou eu que lhes dou as respostas, são eles”
Um doente oncológico, muitas vezes, precisa de se abstrair da doença para tentar seguir uma vida mais “normal”, pelo que a coach explica que deve existir “uma mudança de mindset, quando se passa a fase da revolta, do sentimento de injustiça, da vitimização e se passa para o lado de perceber que cada um tem um papel muito importante no seu processo de tratamento, o doente percebe que não tem outra opção senão reagir. (…) A verdade é que se aproveitarmos esta oportunidade que a vida nos está a dar para mudar o que está menos bem, esse passa a ser o nosso foco e deixamos de nos prender nos medos e limitações que possamos ter”.
A par desta mesma questão, Andreia Costa adianta ainda que “o princípio é prender o nosso foco naquilo que podemos controlar, como por exemplo o estilo de vida que optamos por ter, e retirar o foco daquilo que não controlamos. Assim direcionamos as nossas energias para aquilo que pode de facto fazer a diferença na nossa saúde e naturalmente deixamos de ver entraves em todo o caminho”, explica.
Para Andreia Costa a informação é algo importante, descrevendo-a como “poder”. No entanto, acredita que, na sociedade, existe ainda “a ideia de que os profissionais de saúde é que têm que decidir pelo doente”, considerando que, para si, “é essencial que o doente tenha em seu poder toda a informação possível para depois em conjunto com a equipa que o assiste decidirem quais as melhores opções”.
“De uma forma mais informal conseguirmos passar informação útil, conseguiremos sossegar o coração de muitos doentes que vivem na dúvida e com medo de questionar os seus médicos”
Ao nível do tratamento psicológico do doente oncológico, Andreia Costa crê serem, “infelizmente, escasso no nosso país. Há poucos profissionais inseridos no SNS e nem sempre há a possibilidade de os doentes recorrerem a ajuda privada. Se houvesse uma intervenção precoce nestes doentes provavelmente teríamos resultados muito positivos”. A coach revela ainda que, segundo vários estudos, existem formas de o doente vivenciar a doença que condicionam o seu desfecho “mais ou menos positivo”.
Enquanto coach, Andreia Costa refere ter “trabalhado com doentes oncológicos durante vários anos como enfermeira” e que, o que procura fazer é, “ajudar o doente a sair dessa fase inicial para que assim possa viver a doença de uma forma ‘saudável’ e ajudá-los a perceber e aceitar que eles têm o poder de escolher onde querem estar, como querem passar por essa fase e que essa escolha pode condicionar a sua saúde de forma muito positiva, mas que o contrário também é verdade”.
Andreia Costa finaliza dizendo que “não escolhemos ficar doentes, mas temos o poder de escolher como vamos viver a doença”, acrescentando que, “essa é a boa notícia, todos têm o poder de fazer essa escolha. Se não o conseguirem fazer sozinhos procurem ajuda, falem com profissionais que estão à vossa volta ou investiguem alternativas. Não desistam de vocês”.
“Dar luta ao cancro” em conjunto!
Maria Dulce Pascoal tem, atualmente, 62 anos e recorda o dia em que lhe foi detetado cancro numa mamografia de rotina, em 2006, aos 47 anos. Relembra que “o nódulo era pequeno, tinha 1 cm, estava bem localizado, explicaram-me os procedimentos. Achei que ia ter de ultrapassar esta fase e que ia ficar tudo bem”. A operação aconteceu em abril de 2006, Maria Dulce Pascoal teve de interromper o trabalho, era professora do ensino secundário e escolheu as férias da Páscoa para terminar o segundo período, achando que no ano seguinte tudo estaria resolvido.
Em 2008 Maria Dulce Pascoal regressou ao trabalho, identificando o cancro como um assunto resolvido, porém, em 2012, num exame de rotina tudo mudou. Encontraram “umas formações sólidas” no fígado de Maria Pascoal e, após um TAC, revelaram-se metástases. A primeira reação de Maria foi achar que “já não havia muita esperança, mas o médico desmitificou o problema. Listou-me uma série de tratamentos possíveis para o meu caso e mais uma etapa me esperava…”, concretiza.
Maria Dulce Pascoal confessa que o dia a dia de quem vive com cancro “é passar muito tempo no hospital” e diz ter tido alturas em que “fazer quimioterapia endovenosa semanal implicava passar dois dias por semana no hospital, entre análises e tratamentos. Foi inevitável ter de me reformar”. Apesar das dificuldades, Pascoal refere tentar apoiar os netos naquilo que pode, aproveita o tempo com a família e com os amigos, além disso, criou ainda um grupo no Facebook chamado “Dar Luta ao Cancro” assim como um site onde procura “ajudar, no possível, as pessoas que precisam de ajuda, sobretudo ouvir, encorajar e mostrar que a esperança não se pode perder”.
“A família é o meu porto de abrigo é quem me acompanha, rejubila com as vitórias e encoraja-me nos momentos de incerteza”, referindo ainda que o marido foi com a própria Maria às “consultas e ajudava-me a compreender questões científicas às vezes mais complicas e a pôr as dúvidas, agora não pode haver acompanhantes”. Maria Pascoal relembra uma das piores partes de ser portadora de cancro: “a pior parte foram os meus pais, consegui esconder-lhes a doença entre 2012 e 2018, mas por causa de um tratamento muito agressivo tive de lhes dizer e foi muito mau”, confessa.
“Pode parecer utópico, mas não tenho dias menos bons psicologicamente falando. Fico apreensiva quando os tratamentos deixam de fazer efeito e tudo aumenta, fico assustada com a mudança de tratamento, mas são meia dúzia de dias e desvalorizo”
Neste momento, Maria Dulce Pascoal continua a enfrentar esta luta e admite que “a confiança, a serenidade e a disponibilidade dos médicos, do hospital público onde sou seguida são determinantes para enfrentar a doença”. Assume que o cancro “mudou a perspetiva de encarar a vida. Todos temos a morte certa, como se costuma dizer, mas a maioria não sente isso, no caso dos doentes oncológicos vivemos com esse sentimento e isso faz-me aproveitar com alegria e intensidade todos os momentos da vida. Passei a valorizar só o que é mesmo importante e também percebi que estar doente não significa morrer primeiro. Já assisti à morte de vários amigos que não estavam doentes quando eu adoeci e que me apoiaram no meu percurso e depois acabaram por morrer primeiro. Um dia de cada vez e bem aproveitado”, explica.
Uma mensagem que Maria Pascoal procura deixar para os doentes oncológicos é de que “a taxa de sucesso é muito grande. Os médicos são muito competentes e as pessoas passam um mau bocado, mas habitualmente superam a doença e continuam a sua vida. Quem não tem essa sorte e tem um cancro agressivo ou um cancro metastizado tem de adaptar a sua vida à situação de doente, como um diabético ou um hemodialisado e preparar-se para uma luta. Não pode desesperar nem perder a esperança. Cada cancro é um cancro”.
De que forma as associações ajudam os doentes com cancro?
Sónia Silva tem 47 anos, é casada e tem 1 filho de 6 anos. É residente no Algarve e, em novembro de 2020, foram diagnosticadas microcalcificações agrupadas na mama esquerda com elevada suspeita de carcinoma mamário. No mês seguinte, através da realização de uma biópsia, confirmou-se um carcinoma ductal in situ com lesão extensa.
No momento em que descobriu que tinha cancro, Sónia relata que sentiu “um mix de emoções: surpresa, medo, receio. Todas ficamos sem chão. Recordo-me de pensar ‘e agora?!’. Estava sozinha e pensava ‘como chegar a casa e partilhar uma notícia destas?’. Assusta-nos porque sabemos que a nossa vida muda a partir daquele momento”.
Ao ser questionada sobre o contributo das associações para com os doentes de cancro, Sónia Silva diz que, desta forma, não se sente sozinha, narrando que “neste processo cruzei-me com gente nova que todos os dias nos transmite força, esperança, coragem. Que partilha o que está a passar ou o que passou, que nos tranquiliza e nos acompanha no dia a dia. Amizades que nascem disto e que sei que vou manter para todo sempre. Benditas redes sociais que nos facilitam a vida com este contacto quase diário”, confessa.
A par da questão das associações, Sónia Silva refere ainda que nas associações “também se aprende muito com workshops, tertúlias, atividades, acompanhamento jurídico entre tantos outros aspetos importantes. São exemplos disto as associações como a Careca Power, Mamahelp, SOS oncológico entre outras. Todas elas passaram a fazer parte do meu dia a dia”.
Para Sónia o momento mais difícil foi partilhar a notícia com a família, relatando que se encheu de coragem e que, inclusive, se treinou ao espelho “como ia fazê-lo para que, quando a altura chegasse, estivesse mais forte que nunca! Nada de choros nem voz trémula. E resultou. Estive sempre firme”, menciona.
Aquando o momento da decisão terapêutica, Sónia Silva adianta que “por parte dos médicos foi igualmente marcante: no meu caso com 2 opiniões distintas de entidades diferentes, ambas válidas, mas que envolvia a escolha de perda total da mama esquerda ou remoção parcial. A decisão é nossa e só nossa e foi momento muito difícil. Neste preciso momento difícil é enfrentar a espera para a cirurgia desde novembro. Acredito que possa acontecer já este março. Alguma ansiedade com os dias a passar confesso”.
Relativamente ao acompanhamento médico, Sónia revela que sente necessidade de se sentir verdadeiramente acompanhada e que deve existir uma partilha de informação médica e formas de tratamento, explicando “tem de haver uma proximidade emocional entre médico e doente. Tem de se falar do bom e do mau, dos prós e dos contras. Tem de haver confiança”.
“Temos de acreditar verdadeiramente que aquelas pessoas nos vão ajudar nesta luta. Eu tive a sorte de encontrar isto tudo na equipa médica que me acompanha no Algarve”
Nesta fase, Sónia aguarda pela cirurgia conservadora da mama, à qual se seguirá de radioterapia. Até ao momento não sabe se deverá precisas de quimioterapia, dependerá do resultado do estudo da peça que vão retirar, no entanto adianta “uma coisa é certa: estarei pronta e de mangas arregaçadas para o que tiver de ser! Afinal quero viver”.
Procura transmitir a mensagem “a quem começa esta fase muita força, coragem e foco na cura e não na doença. É possível superar o cancro – temos acima de tudo de acreditar! Às guerreiras desta luta o meu reconhecimento pela sua força e que nunca desistam no matter what. Viver vale isso tudo!!”, conclui.
Enfrentar uma nova lista de prioridades
Magda Alves tem 46 anos, é empresária e foi diagnosticada com cancro da mama em 2018. A sua reação foi diferente, relata ter pensado “finalmente apanhou-me! Andava há anos a ser vigiada com frequência. Primeiro porque a minha mãe foi diagnosticada com cancro na mama esquerda em 2005 e em segundo porque tinha motivos de preocupação na mama esquerda (que ainda cá estão porque o diagnostico foi na direita)”.
Para Magda a família teve “toda a importância” para enfrentar o cancro, uma vez que “é absolutamente vital ter a companhia da família e dos amigos para enfrentar o processo”. Apesar disso, Magda confessa ter a tendência de, nos dias menos bons, cavar as suas “fossas”, explicando que procura “escavar os meus buracos sozinha sem pedir ajuda, fui sempre assim. Vou buscar forças, isso sim, aos meus filhos e à minha mãe a quem a doença não dá tréguas há 15 anos e nos continua a ensinar o que é agarrarmo-nos à vida!”.
O momento mais difícil para Magda foi mesmo a carta com “a palavra maldita – carcinoma -, o internamento de mais de 2 semanas longe do meu filho mais velho que estava a começar as aulas num novo colégio nessa altura e a ‘luta’ que tive no IPO quando lhes pedi que me tirassem as 2 mamas e eles insistiram em só tirar a direita! Foram momentos angustiantes que só me stressaram e que ainda hoje me trazem angústias”, confessa.
Refere ainda que a importância dos médicos, para si, foi pouca, uma vez que sentiu que os “cirurgiões são absolutamente frios e insensíveis! Á enfermagem, devo tudo! A minha recuperação é 100% da responsabilidade da enfermagem, são incríveis!”.
Magda descreve a própria vida ganhou uma nova lista de prioridades “ordenada de forma diferentes do que era antes. Também relativizo tudo de forma diferente. O meu botão de ‘mandar à m&%$#’ também está mais sensível!”, desabafa. No que toca à questão dos tratamentos, Magda Alves admite que os encara com “uma grande chatice, mas necessários. O sentimento que mais me assalta é o receio de recidivas ou novas incidências. Cada vez que lá vou fazer um exame, fico ansiosa até ao resultado dizer que está tudo igual – nesta altura da minha vida, tudo igual é muito bom!”.
“Não sou ninguém para dar conselhos, mas se me pede um é o de sorrir, sorrir sempre! O cancro não gosta de quem sorri e vai-se embora mais depressa! A boa disposição (nem sempre fácil, bem sei) e o sorriso, são metade da cura!”
“Foi como se estivesse a assistir a um filme”
Tânia Melo é natural do Montijo e tem 37 anos, desde os 26 que tem um Linfoma de Hodgkin, um tipo de cancro. Já passou por várias fases da doença nos últimos anos e, neste momento, encara o cancro como uma doença crónica, sentindo, ainda assim, esperança no futuro e na possibilidade que a ciência poderá trazer à área.
Quando descobriu que tinha cancro, Tânia revela ter-se sentido tonta, “como se estivesse a assistir a um filme, custava-me a acreditar que era meu”. As suas manhãs são dedicadas às ervanárias, “Essência Nature”, a qual fundou com a irmã no decorrer da sua doença.
Tânia caracteriza a família como sendo de máxima importância para si, uma vez que, na realidade, “a família é aquela última rede que está lá para que a queda não seja tão dolorosa e que nos ajuda a levantar do chão, mesmo naqueles dias mais cinzentos”, acrescentando que, nos dias menos bons, se apoia “na leitura, na meditação e principalmente no Yoga”.
Tendo em conta os tratamentos, Tânia confessa que os médicos têm muita importância para si, essencialmente por ser “acompanhada no IPO por seres extraordinários! Acredito no papel de todos eles no meu processo de cura!”, confessa. Ao mesmo tempo, para Tânia Melo, tudo mudou, a “maneira de ver a vida, a minha maneira de ver a morte, a forma de me relacionar com os outros, a forma de me relacionar comigo mesma…” e acrescenta que sente “muita gratidão por ter nascido num país onde o acesso a estes tratamentos é possível e em grande parte, gratuito. São muitos os sentimentos que surgem, mas no final do dia só deixo ficar a fé e a resiliência”, conclui.